Bom, primeiro, dormir no Centro de Convergência com helicópteros sobrevoando todo tempo de madrugada, com medo de uma possível invasão policial, e manifestar com centenas de bombas de gas lacrimogêneo deixa qualquer pessoa alterada. e de fato o susto foi grande e muitas ocasiões...
Vou escrever com mais calma depois, mas de antemão vão minhas impressões e alguns relatos.

Foi no segundo dia que as coisas começaram a ficar mais violentas. Mesmo nos locais onde manifestações "pacíficas" ocorreriam, o gás tomou conta. Estava em uma delas, perto da "linha vermelha", e quando nos retirávamos de lá para nos reunir em outro grupo maior, as bombas começaram a voar. Uma companheira de meu grupo de afinidade quase vomitava , pois as bombas caiam as dezenas sobre nossos pés.

O que foi organizado em 3 blocos - Black (BB), Pink e White - virou uma confusão só: havia de tudo no mesmo espaço. Este dia vi um grupo BB enorme passar por entre a gente, preparados para a guerra. Acabavam de espancar um suposto policial infiltrado. Pouco tempo depois o ativista foi morto - e saber disso a noite deixou o clima no Centro de Convergência pesadíssimo.

No terceiro dia a manifestação foi enorme, com cerca de 300 mil pessoas, de tudo que era tendência - inclusive um grande grupo anarquista que se destacava dos Black's (nem todos anarcos estavam entre os BB). Ao mesmo tempo, a guerra nas ruas tomava conta. O barulho das sirenes era espantoso, de ambulâncias, policia e bombeiros. Por onde os BB passavam, tudo era destruído - carros importados e velhos, pequenas lojas e telefones públicos. Tudo. As ruas de Genova estavam parecendo um depósito de lixo. O cheiro de gás pela cidade também era demasiado forte.

Em meu grupo revisamos os jornais, e as matérias mostravam o movimento "anti-globalização" (que NÃO concordo com o nome) como jovens mascarados e violentos. Mostravam o caos... queriam matéria para vender, e as fotos de Carlo Giuliani foram usadas aos montes. O que rolou fora disso não teve espaço nenhum. De 40 fotos analisadas, 1 foi do ato de 300 mil pessoas no último dia - o resto, quebra-quebra.

O Centro de Convergência foi um desastre em termos ecológicos: lixo descartável por toda parte, nada de seletividade ou coleta (a não ser pelo esforço voluntário de uns poucos brav@s) e junk-food (incluindo Coca-Cola) por toda perte; e sem alternativas para vegetarianos/veganos.

DISCUSSÃO

Mas o que mais está em pauta pelo momento agora, e que discutimos em uma reunião com o grupo em que estávamos, foi a ação dos Black Blocks. Está clara que o papel da mídia aqui foi fundamental para passar a imagem do movimento "anti-globalisação" (sic) como uma parte minoritária do movimento, ocultando o caráter mais político de ambos os movimentos. Sobre este último, no caso dos BB, não está claro quais são os reais integrantes... Algumas testemunhas viram integrantes dos BB, após conflitos violentos, conversarem amigavelmente com policiais - o que mostra uma possível infiltração no grupo. Hooliganismo também é outra possível infiltração - pessoas que querem apenas quebra-quebra, sem visão política nenhuma. Tudo isso justifica a ação violenta de policiais contra tudo e todos. A violência passa a agredir quem passa pela frente, e não distingue um McDonalds de um telefone público. Pra quem não sabe, as lojas burguesas, assim como McDld's, estavam todas dentro da "linha vermelha" - esse foi um dos motivos principais para impedir a passagem de pessoas.

Pessoalmente, sempre admirei a ação dos BB, mas vi de perto que uma boa parte dois que o compõem são bastante conscientes do que fazem, e o controle acaba se perdendo com muita facilidade. Conversando com anarquistas gregos de um grupo BB, eles me explicaram todas suas táticas e intenções, e me disseram que de fato as coisas saíram inesperadas e nada de acordo com o planejado para eles. Os Tute Bianchi também planejavam algo diferente, e ao final criticavam muitas das ações que tomaram conta das ruas em Genova. (Estes, inclusive, alegam ter fotos que provam a infiltração policial em grupos BB). A idéia original era a de reponder organizadamente a repressão policial, empurrando-os para frente e protegendo os demais manifestantes - como um grande escudo. Os alvos seriam grandes lojas, mas para isso pretendiam entrar na "zona vermelha" - o que era impossível de fato.

Minha intuição é a de que devemos encontrar dentro do movimento, um "meio termo de ação", não pacífico mas também não "kamikaze" (onde mártires e "macho attitude" acabam tomando conta naturalmente). As pedras agora estão se voltando contra os BB, e com alguma razão.

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