Enviado por Monday, September 02 @ 16:15:58 PDT por Filipe Ferreira
http://infolivre.mahost.org/modules.php?name=News&file=article&sid=104
Tradução por Emilio Gennari.
O processo de paz nas mãos da Corte: ONG de Chiapas.
Hermann Bellinghausen. La Jornada 15/08/2002.
San Cristóbal de las Casas, Chiapas, 14 de agosto. Organizações civis e de direitos humanos desta cidade pediram à Suprema Corte de Justiça da Nação (SCJN) "que assuma sua responsabilidade histórica de agir e tomar decisões que respeitem os direitos dos povos indígenas do México".
Num comunicado conjunto, "advertem e responsabilizam" o Poder Judiciário "pelas graves conseqüências que podem se gerar diante das decisões a serem tomadas" em relação à reforma constitucional em matéria de direitos e cultura indígenas, já que poderia legitimar violações ao processo de legislação e gerar assim "uma perda maior de credibilidade nos poderes da União".
Isso favoreceria "uma acirramento do conflito armado no México, sobretudo em Chiapas", ponderam as organizações Desenvolvimento Econômico e Social dos Mexicanos, Comissão de Apoio à Unidade e à Reconciliação Comunitária, Centro de Direitos Humanos Frei Bartolomeu de las Casas, Centro Indígena de Capacitação Integral e Coordenação da Sociedade Civil em Resistência.
Ao convalidar a chamada reforma Bartlett-Cevallos-Ortega, a Corte "daria passagem ao fracasso e ao esgotamento das vias legais e pacíficas e continuaria dando marcha ré à Convenção 169 da OIT". Sobretudo, "se evidenciaria que a estratégia do governo é a dispersão e a ruptura do movimento indígena do país, favorecendo os interesses do capital estrangeiro".
O documento não poupa advertências. "Deixar-se-ia manifesta a impunidade do Poder Legislativo para emitir normas ou leis que faltem aos processos legais e, finalmente, evidenciaria a falta de vontade em relação à retomada do processo de paz e à ausência de interesse (do Estado) quanto ao respeito dos direitos humanos e dos povos indígenas".
Afirmam que, desde 1996, com a suspensão do diálogo entre os zapatistas e o governo federal, "têm aumentado as condições de deterioração nas comunidades indígenas de Chiapas".
"A crescente militarização, a impunidade propiciada pelos governos federal e estadual ao não agir diante dos grupos paramilitares, a situação de deterioração das comunidades refugiadas, bem como as graves violações dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, são transgressões que atentam contra a dignidade dos povos indígenas". Acrescentam: "Os povos indígenas do México e de Chiapas têm procurado fazer com que os vários governos respeitassem seus direitos; contudo, a resposta tem sido um agir contra estes".
Em 2001, relatam "o EZLN apresentou à nação mexicana (...) as reivindicações dos povos indígenas para intimar os legisladores a aprovarem o projeto de lei elaborado pela COCOPA". Contudo, foi aprovada uma reforma "contrária a esta reivindicação social". Como resultado, os povos indígenas "impugnaram dita reforma, apresentando pedidos de inconstitucionalidade".
Sublinham que as Câmaras dos Deputados e dos Senadores desrespeitaram o processo de votação estabelecido no artigo 135 da constituição. O Executivo federal também "deixou de cumprir o seu dever de fazer respeitar a constituição, sobretudo, o artigo 133", acrescentam. Com a reforma aprovada, dizem, o Estado mexicano "não aplicou a Convenção 169 da OIT e não respeitou o direito à consulta de acordo com as formas próprias dos povos indígenas, estabelecido no artigo 6 da mesma Convenção" (a cujo cumprimento é obrigado por lei).
Com base nestas considerações declaram: "a SCJN deve cumprir (seu dever), dando um veredicto favorável aos pedidos de inconstitucionalidade apresentados como legítimas reivindicações dos povos indígenas do México e de Chiapas; deve cumprir a Convenção 169 da OIT e proceder conforme manda seu artigo 6".
A Corte tem em suas mãos, concluem, "a oportunidade de fazer respeitar os acordos de San Andrés e desta maneira contribuir para o processo de paz no México e, sobretudo, em Chiapas".
Denunciam assédio aos zapatistas que exigem esclarecer assassinato.
Hermann Bellinghausen. La Jornada 17/08/2002.
Município Autônomo 17 de novembro, Chiapas, 16 de agosto. Há uma semana do assassinato de José Santíz López na comunidade 6 de Agosto - ocorrido no último dia 7 - as bases de apoio do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) iniciaram nesta quarta-feira um plantão por tempo indeterminado nesta comunidade para reivindicar o esclarecimento do crime e a punição dos culpados. Centenas de camponeses, em sua maioria tzeltales e tojolabales, participam da mobilização "pela justiça".
Hoje, o Conselho Autônomo do Município 17 de Novembro denunciou que o plantão é hostilizado pela Segurança Pública do estado e pela polícia municipal de Altamirano. Ontem pela manhã, pouco depois do patrulhamento dos agentes, foram ouvidos tiros perto de 6 de Agosto.
Logo após os disparos, passou diante do plantão um veículo, guiado por um dos empregados da administração municipal de Altamirano que tentaram confundir os zapatistas, no último dia 8, após o assassinato de López Santíz. Este "servidor público" encontra-se, novamente, detido pela Comissão de Honra e Justiça do município em rebeldia.
"Se não for encontrada nenhuma responsabilidade (no tiroteio de ontem) será posto em liberdade", declaram as autoridades autônomas. Na cabeceira municipal de Altamirano e nos seus arredores perdura um clima de tensão.
Num comunicado, o município autônomo sublinha que, há uma semana do homicídio, "os governos municipal, estadual e federal nada fizeram contra os assassinos que, ao contrário, têm recebido a proteção do Ministério Público e dos governos".
"A mentira continua em seu coração, com ela se defendem e nos atacam, permitindo assim que a injustiça continue sobre o nosso povo. Mais uma vez, denunciamos que os assassinos são: Baltazar Alfonso Utrilla, Benjamin Montoya Oceguera e Humberto Castellanos Gómez. São cúmplices: Constantino Kanter, a prefeitura de Altamirano, o Ministério Público, a Segurança Pública e os policiais. A justiça nunca vai vir deles".
Informam que na quarta-feira 14 de agosto iniciaram "um plantão pela justiça no novo centro populacional 6 de Agosto", e lançam um apelo às organizações de direitos humanos e à sociedade civil para que acompanhem esta mobilização".
Denunciam também "o patrulhamento e a zombaria que a Segurança Pública está fazendo nas proximidades do nosso plantão. Às 11.00 hs. da manhã do dia 15, foram ouvidos vários tiros quando os policiais se aproximaram de onde estávamos. Naquele mesmo instante passou um veículo que agora, junto com o motorista, é objeto de investigação de nossa Comissão de Honra e Justiça".
As autoridades autônomas dizem ter retido tanto o veículo como o motorista; se nele "não for encontrada nenhum envolvimento nos fatos, será posto em liberdade".
Anunciam que permanecerão de plantão, "exigindo a entrega dos assassinos". Assim como foi informado pela imprensa estadual, os zapatistas sublinham que tanto os acusados, como seus familiares, se esconderam fora do município de Altamirano.
"Como município autônomo, não vamos permitir faltas de respeito à nossa dignidade, nem que os assassinatos fiquem impunes. Vamos lutar e vamos fazer justiça", conclui o conselho autônomo.
Sobrevôos na selva.
Informes provenientes dos municípios autônomos San Pedro de Michoacán e Tierra y Libertad, ao sul da selva Lacandona, confirmaram os sobrevôos de aviões militares de grande porte, todos os dias das últimas semanas, sempre entre as 19.00 e as 20.00 hs, com o mesmo trajeto. Ocasionalmente, os vôos se repetem pela manhã, por volta das 7.00 hs., sobre La Realidad, San José Del Rio, Guadalupe Tepeyac, San José Buena Esperanza e outras comunidades.
Testemunhos de indígenas vindos da região sublinham que, inclusive, moradores detectaram o "cruzar-se" no ar de duas aeronaves, ao que parece "numa rota" ao longo do vale e das montanhas próximas à Guatemala, sobre os municípios oficiais de Las Margaritas e Trinitária, entre Marquês de Comillas e Comitán.
Sobrevôos semelhantes têm sido registrados pelos municípios Emiliano Zapata e Libertad de los Pueblos Mayas, nos vales de Ocosingo e na parte central dos Montes Azuis. Tudo isso, coincide com as recentes denúncias de patrulhamento e movimentação terrestre das tropas do exército das cidades de Palenque e Ocosingo para o interior da selva Lacandona.
Denúncia do Município Autônomo San Manuel.
À imprensa nacional e internacional
À opinião pública nacional e internacional
Às organizações de direitos humanos.
Hoje, 19 de agosto de 2002, às 6.30 hs. da manhã, 22 carros (pick-up, micro ônibus e pequenos caminhões Nissan) que chegaram de Taniperla, Monte Líbano, Perla Acapulco e Peña Limonar, pararam no povoado Nuevo Guadalupe, cruzamento Quexil, onde há um bloqueio das bases zapatistas para o controle do tráfico de madeiras, bebidas alcoólicas e carros roubados.
Dias antes, os companheiros deste bloqueio zapatista haviam detido um caminhão carregado de madeiras nobres que se dirigia a Ocosingo.
As pessoas que chegaram nos 22 veículos começaram a atirar pedras contra o letreiro que está no cruzamento Quexil, onde há um desenho de Zapata e do Sub Marcos e indica que se trata de um Município Autônomo Rebelde. Há também um letreiro no qual se anuncia que se proíbe o tráfico de bebidas alcoólicas, madeiras nobres e carros roubados. Uma das pessoas que liderava o grupo de paramilitares desceu de um dos veículos e se dirigiu à casa do companheiro autoridade zapatista Marcos Méndez Sánchez, onde, apoiado por vários paramilitares, deteve Marcos Méndez. Outros dois companheiros bases de apoio, Felipe Gómez Sánchez e Rigoberto Sánchez, também foram detidos pelos paramilitares. Outros dois companheiros bases de apoio conseguiram fugir e foram pedir ajuda a outros companheiros. Em seguida, voltaram e tentaram conversar com os paramilitares para ver se era possível resolver o problema pelo qual haviam vindo. A resposta foi que começaram a atirar as pedras que carregavam nos caminhões que chegaram ao cruzamento pela manhã e começaram a carregar a madeira retida pelo bloqueio zapatista alguns dias antes. Além de atacar com pedras, os paramilitares começaram a agredir com facões e a atirar com revólveres e armas longas.
Já haviam feito subir num caminhão os três companheiros detidos para levá-los embora. Dois deles conseguiram se jogar e fugir, mas Rigoberto Sánchez Gómez não conseguiu se jogar e o levaram embora para um lugar desconhecido.
Marcos Méndez Sánchez que conseguiu se jogar do caminhão, recebeu um tiro no estômago de uma arma calibre 22, razão pela qual se encontra em estado grave. O companheiro Felipe Gómez Sánchez recebeu dois tiros, um nas costas e outro no ombro e está em estado grave. No momento em que tratava de ajudar seus companheiros, atiraram no braço de Juan Méndez Sánchez. Francisco Méndez Vázquez recebeu um tiro no pé e várias pedradas na cabeça.
Dois companheiros bases de apoio conseguiram pegar um facão de um dirigente paramilitar que recebeu vários golpes na cabeça e na perna. Este dirigente conseguiu fugir quando outro paramilitar veio em sua ajuda com um revolver na mão.
Os paramilitares entraram na casa do companheiro Marcos Méndez Sánchez e lhe roubaram vários pertences, pegaram um companheiro zapatista de idade e também deram pontapés na filha de Marcos Méndez, Irma Méndez Gómez, de 11 anos. Vários caminhões tentaram atropelar as mulheres bases de apoio zapatistas que defendiam seus companheiros que estavam sendo agredidos. Momentos depois, todos os agressores paramilitares fugiram em seus carros e caminhões rumo a Ocosingo onde atualmente encontram-se posicionado no parque central.
Horas depois, este município autônomo pôde averiguar que o companheiro Rigoberto Sánchez Gómez havia sido levado à cidade de Ocosingo. Durante o trajeto pararam no rancho San Miguel. O companheiro tinha os olhos vendados, bateram nele em várias ocasiões e ameaçaram queimá-lo vivo com gasolina. Tiraram os sapatos dele. Depois levaram-no para a Procuradoria do Estado, em Ocosingo, onde foi interrogado. Em seguida, foi transferido ao presídio público e aí lhe tiraram o cinto e os 20 Pesos que tinha na sua bolsa. Depois o transferiram novamente para a Procuradoria de Justiça onde lhe tiraram uma fotografia.
Sabemos, através de companheiros que estavam na Procuradoria de Justiça no momento em que interrogavam o nosso companheiro Rigoberto Sánchez Gómez, que lá na Procuradoria estavam também Juan José Gómez, Isidro Gómez Encino, Luis Correa Guajardo, Pedro Chulín (OPDIC) e Omar Burguete, prefeito de Ocosingo; em seguida, os últimos dois foram para San Cristóbal de las Casas, supostamente para encontrar-se com o governador do estado Pablo Salazar Mendiguchía.
Este município autônomo denuncia que as mais de 200 pessoas que chegaram ao cruzamento Quexil pertencem à organização OPDIC, que está realizando ataques em vários municípios autônomos, e responsabilizamos o governo estadual porque os dirigentes deste grupo paramilitar são bem conhecidos, alguns deles, como Pedro Chulín, têm cargos públicos.
Os governos federal e estadual querem continuar provocando enfrentamentos e debilitar a resistência dos Municípios Autônomos em Resistência. Apresentam estes ataques como disputas de terras ou conflitos entre indígenas, mas são as autoridades federais e estaduais que apóiam diretamente estes paramilitares.
Declaramos que continuaremos em rebeldia contra o mau governo e chamamos a sociedade nacional e internacional a ficar atenta a outros possíveis ataques contra os Municípios Autônomos para que se mobilize em apoio à nossa justa luta.
Democracia, Liberdade e Justiça com Dignidade.
Relatam tentativa de linchamento de zapatista em Polhó.
Hermann Bellinghausen. La Jornada 23/08/2002.
Município Autônomo 17 de Novembro, Chiapas, 22 de agosto. Nestes dias, vive-se em Chiapas o pleno ressurgimento dos grupos paramilitares, mesmo que oficialmente "nunca tenham existido". Em poucos dias, tornaram evidente sua presença em Ocosingo, Altamirano e Chenalhó. O súbito agravamento das hostilidades contra as comunidades zapatistas, através de ações mal-disfarçadas de "conflitos comunitários", parecem marcar uma nova escalada da guerra de baixa intensidade que pesa sem cessar sobre os povos indígenas de Chiapas.
San Manuel, Ricardo Flores Magón, San Pedro Polhó, 17 de Novembro e Francisco Gómez são, até agora, os municípios autônomos contra os quais foi diretamente "lançada" a ofensiva.
Enquanto o município 17 de Novembro denunciou o aparecimento de um novo grupo paramilitar na região de Altamirano (onde no último dia 7 foi assassinado o representante zapatista José López Santiz), nas proximidades de Polhó, 30 pessoas, conhecidas como próximas aos paramilitares, tentaram assassinar um membro do município autônomo que se salvou atirando-se num barranco e rolando por cerca de 200 metros.
Enquanto isso, o município Francisco Gómez denunciou a ameaça de um ataque paramilitar contra o posto de controle instalado pelos zapatistas em El Salvador, assunto que agora ganha espaço na mídia eletrônica, que não se comove pelos zapatistas mortos e feridos, mas que treme de raiva por uma taxa de 10 Pesos cobrada em um único povoado do vale Patihuitz.
Esta novidade se somou aos bem-organizados ataques dos membros da priista Organização para a Defesa dos Direitos Indígenas e Camponeses, OPDIC, contra as comunidades La Culebra e Nuevo Guadalupe, deixando cerca de 15 zapatistas feridos (dois deles em estado grave). Em Nuevo Guadalupe (cruzamento Quexil) foram registrados também cinco feridos priistas.
Foi identificado um novo grupo paramilitar.
As autoridades autônomas de 17 de Novembro denunciaram que na região de Altamirano, onde "a impunidade continua", está se desenvolvendo um bando de paramilitares, que se denomina SISEN". Esta organização, acrescentam, "é do conhecimento do prefeito, da Segurança Pública e da base militar.
Na comunidade Galilea, "um grupo de pessoas do PRI e do PT tem um campo de treinamento" (e não propriamente esportivo). O governo, "até agora, continua sem fazer nada contra este campo. Os líderes José Lino Gómez Hernández, Gerardo Aguilar Gómez e Floriberto Morales continuam gozando a liberdade". Entram e saem de Altamirano, segundo a denúncia zapatista. "Usam uniforme azul marinho, tanto a camisa, como o gorro e a calça, idêntico ao que é usado pela Segurança Pública. Temos uma fotografia do senhor Floriberto Morales Vázquez quando estava uniformizado".
"Um segundo capitão, de nome Alfredo Alvarado R. (destinado à base do Exército federal da cidade de Altamirano), é a pessoa que tem contato direto com os paramilitares; é ele que entrega as máquinas fotográficas, as filmadoras e os rádios de comunicação para que nos rastreiem, nos vigiem e tenham em suas mãos tudo o que fazemos e como somos. Seu contato obriga-os também a pegarem informes por escrito sobre o que acontece na região e são pagos de acordo com a importância do informe. Eles entram mais nas comunidades divididas e oferecem dinheiro e telhas para que os moradores abandonem sua resistência. Preferem dar mais dinheiro do que telhas, porque é menos visível".
A autoridade zapatista indica que "no interior da região, foram vistas pessoas estranhas uniformizadas com camisa gorro e calça pretas, carregando armas de alto calibre". Esta "estrutura do Exército federal com os paramilitares, dizem, "nos preocupa porque é uma prova de que querem nos provocar com a intenção de semear o terror no interior do nosso município. Nós não queremos ver mais sangue ou morte de indígenas em nossos povoados. Nós estamos trabalhando em paz, semeando nossa terra", declaram. Todavia, "os governos federal estadual e municipal estão dispostos a romper nossa unidade e a gerar violência e guerra entre os indígenas".
Acusaram-no de roubar umas cordas.
O conselho municipal autônomo de San Pedro Polhó, através de seus representantes Agustín Pérez Parcero e Agustín Pérez Santiz, condenou e rechaçou "energicamente" os acontecimentos de domingo 18 de agosto quando, às 12.00 hs., "num terreno onde há um areal de areia grossa" Mariano Pérez Gómez "foi agredido e acusado injustamente do roubo de cordas para medir terrenos".
Pérez Gómez "voltava do trabalho na colheita quando um grupo de pessoas, a cerca de 5 metros dele, lhe ordenou de parar. O companheiro atendeu sem medo e, logo em seguida, foi acusado de ter roubado umas cordas. O companheiro negou sua culpabilidade várias vezes e quando se ordenou a ele que dissesse a verdade por bem ou por mal, e ele garantiu não saber de nada, foi apedrejado. Em seguida, mais de 30 pessoas se lançaram contra ele com agressões e ameaças de morte, mas, por sorte, ele pôde escapar ao que lhe parecia ser um massacre".
"Ao não vê-lo - prosseguem as autoridades de Polhó -, os agressores circundaram a área, mas não conseguiram pegá-lo, pois o companheiro se jogou num barranco para se esconder, caindo aproximadamente 200 metros para salvar sua vida. Por sorte, as lesões não foram graves, e viu como os agressores jogavam pedras grandes que podiam cair só a cerca de 150 metros, razão pela qual não o atingiram".
O conselho autônomo garante que os agressores "atentaram contra a vida do jovem companheiro, que, já fora de perigo, dirigiu-se à sua casa para dar a notícias e investigar se alguém saiu morto. No lugar dos acontecimentos foram encontradas muitas pedras e um chapéu-de-palha branco propriedade dos paramilitares".
Nos fatos ocorridos "está envolvido um grupo priista e cardenista (vinculado ao que foi o Partido da Frente Cardenista), encabeçado pelo representante de bens comunais do município de Chenalhó, Pedro Mariano Arias Pérez, como presidente, Antonio Pérez Santiz, Mariano Hernández Pérez, Gilberto Gómez Pérez e outros". Estes são identificados como "os encarregados de organizar grupos paramilitares, com a aprovação do prefeito constitucional Armando Vázquez Pérez.
"Pedimos que este problema seja levado em consideração, relacionado com o terreno onde se encontra o areal de Majomut que, desde 21 de novembro de 1996, ficou sob a administração da câmara municipal autônoma de Polhó, tal como é estabelecido pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho". Aí, argumenta o conselho de Polhó, se estabeleceu que fica estritamente proibido explorar, por parte de grupos particulares ou coletivos, "neste caso cardenista", terrenos que sejam propriedade de comunidades indígenas.
As autoridades municipais consideram "uma provocação" o ataque (ocorrido a uns dois quilômetros de Acteal, que continua sendo, como o próprio Polhó, um acampamento de refugiados). Nestes momentos, denunciam, "algumas comunidades priistas estão se organizando para atacar novamente os companheiros refugiados".
Município Autônomo em Rebeldia Ricardo Flores Magón
Chiapas, México, 26 de agosto de 2002.
Ao povo do México.
Aos povos do mundo.
Aos centros de direitos humanos.
À imprensa nacional e internacional.
Irmãos e irmãs.
Mais uma vez, levantamos nossa voz para informá-los a respeito dos fatos ocorridos no dia 25 de agosto de 2002 no rancho Amaytik deste Município Autônomo Ricardo Flores Magón.
Apesar de todas as ameaças e do assassinato por parte do mau governo, nossos povos continuarão resistindo e lutando por democracia, liberdade e justiça.
Conselho Autônomo.
Centenas de efetivos do exército se embrenham nos vales de Ocosingo.
Hermann Bellinghausen. La Jornada, 27/08/2002.
San Cristóbal de las Casa, Chiapas, 26 de agosto. Centenas de efetivos do Exército se embrenharam hoje nos vales da selva Lacandona e em direção a Palenque, no extremo norte da própria selva. Dezenas de caminhões transportaram contingentes de soldados armados e equipados e foram mobilizados veículos blindados e de combate que se dispersaram em várias direções no interior dos vales de Ocosingo, nos municípios autônomos Ricardo Flores Magón, San Manuel e Francisco Gómez.
Criando uma súbita situação de tensão e medo, que foi preparada ao longo de toda a semana anterior, o Exército entrou nos vales atrás de boatos. Até o momento se desconhecem as razões deste grande desdobramento de tropas. Enquanto isso, as autoridades judiciárias do estado deixam desaparecer um morto e obtêm resultados decepcionantes em suas investigações.
O comitê pelos Direitos Humanos Frei Pedro Lorenzo de la Nada declarou hoje à noite ao La Jornada que "esta é a primeira mobilização de grande envergadura do Exército nos vales desde que o presidente Vicente Fox anunciou a retirada dos militares dos acampamentos de Amador Hernández, Las Garrucha, Guadalupe Tepeyac, Cuxuljá, Roberto Barrios, Oventic e La Realidad, em dezembro do ano 2000, quando tomou posse do seu cargo". Contudo, desde 1995 não tem havido nenhuma retirada de tropas da região do conflito.
Informes dos municípios autônomos que rodeiam a cidade de Ocosingo, bem como vários relatórios de organizações civis de observação, permitem afirmar que a operação do exército começou ontem às 17.00 hs., quando chegaram os primeiros dez caminhões com os soldados ao quartel geral da 39a Região Militar. Às 18.00 hs., mais 20 veículos. Uma hora depois, 30. Às 20.00 hs. chegaram 40, e às 21.00 hs. mais 15.
A isso devem ser acrescentadas as tropas que já se encontravam no quartel militar do acampamento militar de Toniná, um dos maiores de Chiapas e quartel da 39a Região Militar do Exército. Dias atrás, a atividade das tropas no quartel havia aumentado visivelmente.
Este Exército reunido em Toniná realizou treinamentos de combate entre as 20.00 e as 22.00 hs. Os soldados não dormiram durante toda a noite, pois gritavam continuamente palavras de ordem, e de tanto em tanto ligavam os motores de seus veículos.
Às 5.00 hs. de hoje, os primeiros 10 veículos saíram de Toniná rumo à cidade de Ocosingo. Às 7.00 hs., outros 20, e 42, armados e precedidos de blindados, em direção a Monte Líbano e Taniperla.
De acordo com o município autônomo San Manuel, nestes caminhões viajavam também civis; acha que se tratava dos paramilitares da OPDIC que estavam em Ocosingo desde o dia 19, quando foram convocados pelo dirigente e deputado priista Pedro Chulín Jiménez.
O Município San Manuel denunciou hoje o deputado Chulín Jiménez como uma das pessoas que abriram fogo contra as bases de apoio do EZLN segunda-feira passada, durante o ataque paramilitar no cruzamento Quexil. Segundo as autoridades autônomas, ontem à noite, se reuniram em Toniná cerca de 300 caminhões, blindados e veículos de assalto do Exército federal. Às 17.00 hs. de hoje saíram ainda mais caminhões com tropas em direção a Monte Líbano.
Além disso, hoje, o município autônomo Primeiro de Janeiro comunicou a movimentação de um longo e intermitente comboio de 2000 soldados em direção a Palenque pela rodovia internacional. Foram registradas também importantes movimentações castrenses, não quantificadas, ao longo da rodovia de fronteira que percorre o norte dos Montes Azuis, na divisa com Tabasco e a fronteira internacional da Guatemala.
Da cidade de Ocosingo, o CDHFPLN confirmou que centenas de efetivos do Exército foram vistos chegar na região militar de Ocosingo durante a noite de domingo. "Foram vistos sair do quartel desde a manhã desta segunda-feira e, em seguida, foram vistos dispersar-se em vários pontos dos vales: 4 caminhões cheios de efetivos armados perto do ejido Nuevo Morelia (na entrada do vale Patihuitz, onde está o município autônomo Francisco Gómez), cerca de 10 veículos, alguns deles de combate e tendo um blindado à frente, no rancho Agua Dulce (entre os municípios rebeldes San Manuel e Ricardo Flores Magón); aproximadamente 10 veículos patrulhando o trecho entre o cruzamento Monte Liban e o destacamento militar El Ocotalito, também com blindados e veículos de combate. Também se observou uma movimentação do Exército rumo à comunidade de Taniperla e rumo a Peña Limonar".
Executam um zapatista; agora foi no município Olga Isabel.
Hermann Bellinghausen. La Jornada 28/08/2002.
San Cristóbal de las Casas, Chiapas, 27 de agosto. Outro indígena zapatista, desta vez pertencente ao município autônomo Olga Isabel, foi assassinado por um conhecido grupo paramilitar. A vítima já havia recebido ameaças de morte por parte de priistas armados do bando Los Aguilares, comandado pelo ex-militar Sebastián Aguilar.
As autoridades autônomas de Olga Isabel denunciam hoje a morte de Antonio Mejia nas proximidades da comunidade K'an Akil, pelas mãos de Los Aguilares, que agem impunemente na região (no interior do município constitucional de Chilón) desde 1994.
Ainda que os fatos tenham ocorrido no domingo, dia 25, só hoje os indígenas puderam tornar pública a denúncia. "Não pudemos recolher o corpo do companheiro, porque os paramilitares disseram que se fossemos aí voltariam a atirar em nós. Procuram fazer com que lhes respondamos, porque disseram que é isso que querem que façamos".
Este é a quarta morte de um membro das bases de apoio do EZLN nestes últimos dias, na que, a cada dia, se revela mais como uma ação coordenada de vários agrupamentos paramilitares que atuam na selva e na zona norte para hostilizar e provocar as comunidades em resistência.
Longe de deter a violência paramilitar, as recentes movimentações do Exército rumo ao interior dos vales e ao norte parecem tê-la estimulado. O acirrar-se da violência neste final de semana, ao norte de Ocosingo e de Chilón, coincide com o extraordinário desdobramento de tropas realizado nesta região entre domingo e segunda-feira.
Com grande ênfase do Diário de Chiapas, o ex-prefeito panista de Tuxtla Gutiérrez, Francisco Rojas, clamava hoje pela intervenção do Exército contra os zapatistas. Sob a manchete "Parem a desordem do EZLN", o delegado estadual do PAN, Francisco Rojas Toledo, instou o governo federal "a pôr fim às ações que o EZLN vem realizando na zona de sua influência", e se manifestou pela "volta do Exército a alguns lugares estratégicos desta região, a fim de pôr ordem". (Vale a pena lembrar que Francisco Rojas é filho do deputado panista Valdemar Rojas que no último dia 13 fez uma gozação, em inglês, de um deputado indígena que falou em tzotzil da tribuna da Assembléia Legislativa chiapaneca).
Assim, enquanto a direita racista prepara a escalada da repressão, as autoridades de Olga Isabel descrevem os autores da nova provocação: "Los Aguilares são temidos por muita gente. No seu comando está o senhor Sebastián Aguilar, que foi membro do Exército e tem parentes que são soldados. È deles que os paramilitares recebem as armas".
E relatam que dias antes do assassinato de Antonio Mejía, os priistas seqüestraram um membro do município autônomo, "que foi interrogado e obrigado a pagar uma quantia em dinheiro. Soltaram-no com o compromisso de que ele deixaria de integrar o nosso município autônomo. Perguntaram-lhe por Antonio Mejía, e disseram que este o fariam desaparecer".
"Quando Antonio foi baleado estava com a sua esposa que o viu cair. Ele fugiu em meio ao tiroteio. O companheiro ficou estendido a 300 metros do seu povoado K'an Akil, perto do lugar chamado Reforma K'an Akil, onde vivem os paramilitares".
O conselho autônomo acrescenta que na noite do dia 26 voltaram a ouvir tiros de armas de alto poder de fogo nas proximidades das comunidades em resistência. "Dizem que vão acabar nos matando um por um". Mais uma vez, parece evidente a intenção premeditada de criar medo, desestabilização e incerteza por parte dos paramilitares. Para isso, contam com um bom caldo de cultura a base de boatos ameaçadores e mobilizações castrenses de considerável envergadura.
"Nossa preocupação é grande, porque os paramilitares não nos permitem entrar para recolher o corpo do companheiro", expressam os representantes autônomos. "Além disso, disseram que se não abandonamos o município autônomo vão nos seqüestrar e obrigar a entregar-lhes uma grande quantidade de dinheiro. Sabemos que essa gente é paga para fazer isso tudo e começar com os assassinatos. Já estivemos denunciando este grupo paramilitar porque tem nos perseguido e ameaçado, e agora chegaram a dar tiros e, dessa forma, procuram fazer com que lhes respondamos, porque disseram que é isso que eles querem que façamos".
As autoridades de Olga Isabel declaram: "Responsabilizamos esse grupo paramilitar pelo assassinato do nosso companheiro Antonio Mejía, mas também os governos federal e estadual. Já em outras ocasiões estivemos denunciando a perseguição dos paramilitares, e eles sabem da existência deste grupo e de suas ações".
Personalidades de 18 países convocam a manter o apoio às causas zapatistas.
Jesus Ramirez Cuevas. La Jornada, 29/08/2002.
As conclusões e recomendações da Comissão Civil Internacional pelos Direitos Humanos (CCIODH) em Chiapas recebem o respaldo de centenas de personalidades, parlamentares, dirigentes políticos, acadêmicos, sindicatos, organizações sociais e cidadãs de 18 países da Europa, América Latina e África.
Entre os que assinam, destacam-se escritores como José Saramago e Manuel Vázquez Montalbán, o cantor Manú Chão, o teólogo italiano Giulio Girardi e Jean Ziegler, relator especial da ONU sobre o direito à alimentação, bem como 14 deputados do Parlamento Europeu, entre eles Alain Krivine e Lucio Manisco. Na longa lista, destacam-se deputados e prefeitos suíços, italianos e brasileiros.
Os observadores internacionais afirmam que em sua última visita a Chiapas, "os sobrevôos de aeronaves militares federais continuam semeando inquietação nas comunidades, os patrulhamentos e os postos de fiscalização do Exército mexicano foram aumentando paulatinamente e já se tornou um hábito que os soldados improvisem seus postos de controle nos arredores dos povoados para perseguir e intimidar os indígenas".
A CCIODH dedica boa parte do informe "aos grupos paramilitares que integram um esquema de contra-insurreição mascarado de agressões por problemas de terras, confrontações partidárias, conflitos religiosos, inimizades pessoais, vinganças familiares ou, simplesmente, acidentais, ocultando desta maneira a estratégia paramilitar de controle, desestabilização e repressão seletiva como parte de uma guerra suja, projetada e dirigida a partir dos mais altos escalões do poder".
"Longe de conter os grupos paramilitares - diz a CCIODH -, estes continuam dando origem a muitos conflitos, fechando caminhos, aplicando uma política de terror, assassinatos e agressões constantes contra as comunidades zapatistas, apoiados, como sempre, pelas velhas estruturas municipal e comunal priistas, e gozando da cumplicidade, por omissão e comissão, do Exército e dos corpos de segurança das várias esferas governamentais".
A CCIODH menciona também a situação dos milhares de indígenas "expulsos de suas terras pela guerra e a contra-insurreição que continua sem solução". E questiona o uso dos programas de desenvolvimento para quebrar a resistência e dividir as comunidades indígenas.
Quanto às reformas constitucionais em matéria indígena, a comissão afirma que ela "não satisfez os povos indígenas que não vêem refletidos nelas a essência dos acordos de San Andrés". E defende que o projeto de reforma da COCOPA é o único que pode restabelecer as condições mínimas do diálogo de paz".
Os observadores internacionais lançaram "um apelo à sociedade civil para que mantenha sua atenção sobre Chiapas diante da diminuição do clima social e político ao redor das comunidades indígenas que simpatizam com o EZLN".
Convite: Se o material que você acabou de ler alimentou um sentimento de indignação que quer se expressar em algo concreto, a seguir, vai encontrar uma sugestão de carta aberta a ser enviada ao presidente do México e à embaixada mexicana em Brasília. Uma vez assinada, com data e local, envie uma cópia a cada um destes endereços:
Presidente de la Republica
Sr. Vicente Fox Quesada
Palacio Nacional
06067
México D. F.
Embaixada do México
S.E.S. Av das Nações, Lote 18 Qd.805
70412-900 Brasília - DF
Carta aberta ao Presidente do México, Vicente Fox Quesada.
Ao Presidente da República do México,
Senhor Vicente Fox Quesada,
Como observador atento da realidade do México e do desenrolar do conflito no estado de Chiapas, venho por meio desta manifestar minha indignação diante dos assassinatos e das constantes perseguições contra as comunidades zapatistas em resistência.
Protegidos pelo silêncio das instâncias governamentais, velhos e novos grupos paramilitares vêm agindo impunemente, deixando um rastro de morte e de terror que encharca suas mãos de sangue indígena.
Além disso, a ação paramilitar encontra-se freqüentemente associada a uma mistura de omissão e apoio por parte do Exército federal e dos corpos policias, cujo currículo de desrespeito aos direitos humanos tem sido denunciado por inúmeras organizações da sociedade civil mexicana e internacional.
Somando estas breves constatações à postura mantida diante da reforma constitucional em matéria de direitos e cultura indígenas e à implantação do Plano Puebla-Panamá, vejo-me obrigado a concluir que, longe de escolher o caminho paz, o seu governo vem dando passos rumo à construção das condições que legitimariam uma saída de força para o conflito chiapaneco.
Convencido de que nada disso vai ajudar a resolver a situação de miséria e de exclusão dos povos indígenas, reafirmo neste escrito a necessidade de:
Só estas medidas abrirão caminho à solução pacífica do conflito e poderão revelar, na prática, a vontade de paz do seu governo.
Atenciosamente.
Assinatura.
Local e Data.