F$M: o braço esquerdo de Davos

Por Euler 27/01/2003 Às 00:53
http://prod.midiaindependente.org/pt/blue//2003/01/246523.shtml

A esquerda domesticada criou o F$M como seu "capital social" para negociar o pacto com a burguesia

A ida de Lula ao Fórum de Davos é o coroamento da estratégia global dos organizadores do F$Poa, baseada na parceria com a burguesia para arrancar mais algumas migalhas para os "pobres" do mundo.

Tem se ouvido falar que o forró de Poa possibilita um espaço de diversidade e encontro entre diferentes movimentos que não se conseguiria de outra forma. Acho que esse discurso é reducionista. Deveríamos estar lamentando o fato de vários movimentos sociais, os que estão participando desse evento, ainda aceitarem este tipo de articulação controlada e manipulada pela esquerda do capital.

Boa parte desses movimentos vem das experiências dos protestos de rua, da ocupação de terra, dos combates de Seattle, e como é que aceitam se submeter a esse espetáculo vazio que é, inclusive, patrocinado por empresas capitalistas, fundação da ford de U$A, governos, estatais, etc? Podemos e sabemos muito bem organizar nosso próprio espaço, realmente autônomo, anticapitalista, sem nos deixarmos iludir com os espaços preparados pelos agentes do capital junto aos movimentos de resistência.

Argumentar que no forró de Poa os revolucionários conseguem contato com muita gente que está iludida com o discurso e a prática da esquerda adaptada é outra maneira rebaixada de encarar o problema. No dia-a-dia fazemos contato com muita gente que está iludida com a nova onda espetacular que se reúne nessa proposta de pacto social. Não precisamos ir ao forró de Poa para dialogar com essas pessoas. Quando o fazemos (quem o faz) acabamos por legitimar o esforço da esquerda adaptada de promover o pacto entre burgueses e proletarizados.

Nem mesmo a proposta de reuniões paralelas pode ser considerada uma atividade que justifique a ida ao forró. Aliás, o próprio F$M é uma atividade "paralela" ao Fórum de Davos. Nossa gente, ao contrário, é aquela que está lá nas ruas, enfrentando a polícia, tentando impedir o encontro que recebeu Lula como estrela, do mesmo jeito que o forró do pindorama o fez.

Façamos nosso próprio encontro e desmascaremos os encontros da burguesia, tanto o de Davos como o de Poa, pois são duas faces de uma mesma moeda. Tanto assim que eles se propõem a "negociar" entre si. Quando Lula disse que iria levar até Davos a mensagem de Poa ele não estava sendo hipócrita, não: ele de fato expressa o desejo majoritário dos coordenadores de Poa, em favor de um "capitalismo mais humano", de um mercado menos cruel com os "países pobres" (falam de países como se os povos que vivessem nesses territórios tivessem o mesmo destino. Para estes senhores, Antonio Ermírio de Morais ou Abílio Diniz, por serem "brasileiros", são equiparados aos milhões de assalariados e desempregados oprimidos e explorados por estes bandidos). Esta gente não quer o fim do capitalismo, mas negociar sua "humanização" - como se isso fosse possível.

O grande dilema é que, para além da ignorância e da má-fé, o capital não obedece a vontades bem-intencionadas de governantes de plantão. A concorrência ditada pelas leis de mercado só conhece uma linguagem: a de manter a exploração a qualquer custo, a de acumular riquezas produzidas por milhões. E enquanto essa gente vai a Davos pedir pros "ricos" terem compaixão, se esquecem de que no Brasil - e em qualquer outro país - tem uma parcela de gente igualmente superbilionária, enquanto a grande maioria morre de fome, na miséria, situação essa provocada pela reprodução de capitais. Basta ver o que ocorre nas próprias estatais, que são a paixão dessa esquerda anacrônica (Petrobrás inclusive), onde a maior parte dos assalariados são de empresas terceirizadas que vivem em situação de risco permanente, com péssimas condições de trabalho. Isso sem falar nos desempregados, nos sem-teto (que as prefeituras do PT expulsam com violência policial, como ocorreu em Guarulhos), os sem-terra, etc.

Portanto, camaradas, não dá para simplificar as coisas e dizer que tem espaço para "todos". Isso é o que a Globo e o cantor Lobão, novo garoto-propaganda daquela emissora, estão fazendo no Fantástico. O que tem de fato é espaço para a esquerda adaptada e corporativa se projetar perante a mídia e exibir, como "capital social" de legitimação, um enorme leque de movimentos sociais que vão lá para aplaudir ou disputar "espaços paralelos".

Não queremos saber de espaços paralelos não, camaradas. Nosso espaço é aquele que conquistamos na luta, como fazem os piqueteiros e okupas e madres da plaza de mayo argentinos, ou os zapatistas em Chiapas, ou os cocaleros bolivianos, ou sem-teto brasileiros, ou os palestinos da Intifada pela base, ou o movimento anti-globalização capitalista quando ocupa as ruas em protesto. Este é o nosso espaço, camaradas: o espaço da resistência, da luta, da autonomia frente aos parlamentos, ao estado burguês, ao mercado e seus porta-vozes. É o espaço que representa a reocupação do nosso tempo que foi transformado em mercadoria e expropriado (roubado) pelos capitalistas.

Que a esquerda domesticada continue fazendo seu jogo de parceria com o capital. De nossa parte, devemos separar as coisas: façamos nossos encontros entre nós, que não nos rendemos, que não queremos nada de mundo "mais humano" no interior do capitalismo, mas sim o fim deste sistema; que protestamos contra a guerra não ao lado das burguesias e dos governos nacionais, mas contra todos os estados "nacionais", contra as fronteiras, contra a exploração capitalista causadora da fome e da guerra. Nossa unidade é pela base, de forma horizontal, e é a única garantia da nossa auto-libertação das garras deste terror imposto pelo capital e seus aliados da esquerda.

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